Neoindustrialização: podemos ser ousados e sábios

Eletromobilidade é a chave para um novo ciclo de desenvolvimento econômico

 

IÊDA DE OLIVEIRA

Dois importantes documentos divulgados recentemente pelo Governo Federal abriram um caminho promissor para a eletromobilidade no Brasil, em particular para o transporte público sustentável.

Eles podem ser o núcleo de um futuro Plano Nacional de Eletromobilidade e balizar a estratégia nacional de transição rumo à economia de baixo carbono.

O primeiro deles é a Medida Provisória 1.205, de 30 de dezembro, que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover). Será a nova política automotiva brasileira, em lugar do Rota 2030, em vigor desde 2018.

As principais novidades do Mover são um compromisso muito mais firme do que o anterior com a descarbonização e um conjunto de incentivos à produção no Brasil de veículos de baixa emissão e seus componentes.

O novo programa cria um Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico (administrado pelo BNDES) e prevê créditos generosos para centros de pesquisa e desenvolvimento instalados no país.

O Mover também se propõe a calcular as emissões de carbono geradas na produção de cada veículo, de cada empresa e até de toda a cadeia produtiva de transporte.

Os novos critérios “do tanque à roda”, “do poço à roda”, “do berço ao túmulo” e de “reciclabilidade” visam rastrear as emissões até a última etapa da vida útil dos veículos, chegando ao descarte de peças e reciclagem das baterias.

Eles representam um considerável desafio para as empresas, mas serão essenciais na distribuição dos benefícios fiscais e creditícios.

O outro documento é o Plano de Ação para a Neoindustrialização lançado no dia 22 de janeiro, contendo as bases do que o governo chama de Nova Indústria Brasileira – NIB.

As metas são ambiciosas: transformar o Brasil, até 2030, num hub global de produção e desenvolvimento de veículos elétricos e híbridos.

No caso do transporte público, aumentar em 25 pontos percentuais o “adensamento produtivo” do setor até 2033 – o que, no caso dos ônibus elétricos, significaria elevar o índice de nacionalização da indústria de 59% para 84%.

Em comum entre os dois programas, há o forte papel reivindicado pelo Estado para instalar novas fábricas no País, revigorar o atual parque industrial e investir em P&D.

Isso ocorreria por meio de incentivos fiscais e créditos (que podem chegar a R$ 19 bilhões) combinados a uma política mais agressiva de instituições oficiais como BNDES e Finep, inclusive com participação acionária em empresas estratégicas.

O Plano de Neoindustrialização foi muito criticado por repetir políticas que não deram certo no passado, mas há motivos para ser otimista.

O cenário mudou. Não estamos mais em 1980 e nem mesmo em 2010. A eletromobilidade é uma realidade irreversível no Brasil e no mundo. Ela virá de uma forma ou de outra, tanto no transporte individual quanto no transporte público.

E não estamos fadados a repetir os mesmos erros. A experiência já nos ensinou que insistir em dar sobrevida a tecnologias e indústrias ultrapassadas cobra um alto preço.

O custo de resistir à mudança será cada vez maior, tanto para as empresas quanto para as lideranças políticas.

Porém, se conduzida com equilíbrio, a política proposta encontrará um conjunto de empresas inovadoras e competitivas, dispostas apostar nas novas tecnologias de transporte sustentável – muitas delas já desenvolvidas no Brasil.

A neoindustrialização passa necessariamente pela descarbonização da economia, por produtos e serviços de melhor qualidade e pela eletromobilidade.

Desta vez, podemos fazer diferente. Podemos ser ousados e sábios.

Artigo publicado na Smart Connect Cities em 20 de fevereiro de 2024

Pará amplia frota de ônibus elétricos para COP30
ANTERIOR
São Paulo começa testes com ônibus elétricos biarticulados da Eletra
PRÓXIMO

Deixe um comentário

Your email address will not be published. Required fields are marked *