Ao lançar uma nova proposta para a Lei de Mudança do Clima de São Paulo, o vereador Gilberto Natalini, do PV (foto), voltou a esquentar o debate na Câmara Municipal sobre a futura matriz energética do transporte público.
O texto fixa metas mais rígidas do que as que próprio vereador admitia para a redução dos gases poluentes emitidos pelos ônibus nos próximos dez e 20 anos (ver íntegra abaixo).
Pela proposta, a frota terá uma década para reduzir 50% do gás carbônico (CO2) emitido e 20 anos para zerar tais emissões, com base nos níveis de 2016.
As emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) deverão ter corte de 80% em dez anos e de 90% em 20, e as de materiais particulados (MP 10 e MP 2,5), respectivamente de 90% e 95%.
ACORDO DIFÍCIL
Na prática, Natalini afasta-se da posição do presidente da Câmara, Milton Leite (DEM), com quem negociava um texto de consenso para ser votado em plenário.
A nova proposta foi preparada pouco depois da reunião do último dia 25, no gabinete de Milton Leite, entre os dois vereadores e um grupo de entidades ambientalistas, que novamente terminou sem acordo (aqui).
Natalini chegou a concordar com redução de 40% das emissões de CO2 em dez anos (limite máximo considerado viável pela SPTrans e aceito por Milton Leite), mas agora volta a defender 50%, com emissão zero em 20 anos.
Reaproximou-se, assim, da posição defendida pelo Comitê de Mudança do Clima de São Paulo (órgão vinculado à Secretaria Municipal do Meio Ambiente) e de entidades como Greenpeace e Rede Nossa São Paulo.
O vereador ainda não decidiu se protocolará seu novo texto como um substitutivo ao antigo PL 216/2003, de sua própria autoria, ou como novo substitutivo ao polêmico PL 300/2017, apresentado por Milton Leite em maio (íntegra).
Ambos lideram os debates entre os vereadores sobre a reforma da Lei 14.933/2009, que instituiu a Política de Mudança do Clima do Município de São Paulo.
Natalini é o principal líder ambientalista da Câmara e Milton Leite, além de poderoso presidente da Casa, é empresário de ônibus e profundo conhecedor do sistema de transporte.
METAS
Outros itens importantes da nova proposta são:
1-Aceita a moratória de cinco anos para a troca do diesel por combustíveis renováveis nos micro-ônibus e veículos da chamada rede alimentadora do sistema de transporte, defendida por Milton Leite. Mas mantém para este segmento as mesmas metas intermediárias e finais dos demais ônibus.
2-Fixa um período de cinco anos para a reavaliação das metas.
3-Determina que o órgão gestor incumbido de supervisionar a mudança da matriz energética da frota seja formado apenas por secretarias da Prefeitura, sob coordenação da Secretaria de Transportes.
4-Admite a participação de entidades empresariais e organizações sociais no órgão gestor, mas apenas para fornecer subsídios técnicos, sem poder de voto – portanto, enfraquecendo a proposta original de Milton Leite.
5-Também defende a volta da inspeção veicular para controle da poluição, livrando os veículos elétricos e híbridos.
ÍNTEGRA
Proposta do Vereador Gilberto Natalini para substitutivo ao PL 216/2003, de sua autoria, visando alterar a PMMC e reduzir as emissões veiculares
Fixa percentuais de redução da emissão total de material particulado, óxidos de nitrogênio e dióxido de carbono para frotas de veículos a diesel, servindo ao transporte coletivo público de passageiros e de carga, prestando serviço contratado diretamente pela administração municipal, através de adoção progressiva de fontes de energia motriz mais limpa, não fóssil e menos ruidosa; Estabelece a inspeção veicular para os veículos automotores a combustão; Revoga o Artigo 50 da lei municipal 14.933/2009 e dá outras providências.
A Câmara Municipal de São Paulo DECRETA:
Artigo 1º
As empresas usuárias de veículos a diesel, prestadoras do serviço de transporte coletivo público municipal de passageiros e as operadoras de serviços de transporte de carga em geral, contratadas diretamente pelo Executivo e Legislativo municipais, para serviços regulares, deverão reduzir, progressivamente, a emissão direta de compostos tóxicos (material particulado e óxidos de nitrogênio), ruído e de gás carbônico (CO2) na atmosfera.
Parágrafo 1º – A mudança deverá ser feita, gradualmente, mediante a substituição, nos vencimentos da vida útil contratual, dos ônibus, micro-ônibus, vans, caminhões, utilitários e veículos leves movidos a diesel ou somente seus motores ou combustível, por outras fontes de energia de tração renováveis e com base não fóssil.
Parágrafo 2º – Os veículos que operam o sistema alimentador terão um prazo de carência de 5 (cinco) anos para início da adesão à progressiva redução das emissões aqui estabelecida, tendo porém que alcançar as metas previstas para o restante da frota.
Parágrafo 3º – Para efeitos da aplicação do caput, são considerados “veículos de carga” os utilizados na coleta pública de resíduos sólidos urbanos – RSU (“lixo”) e resíduos hospitalares; os do tipo limpa-fossa, caminhões-tanque de transporte de água potável e de reúso e qualquer outro veículo a diesel de propriedade, arrendado ou contratado diretamente para serviço de caráter permanente pelos Poderes Executivo e Legislativo municipais.
I – Aplicam-se as exigências estabelecidas no caput também aos veículos de empresas subcontratadas de forma continuada pelas titulares de serviços públicos regulares para atender parte do escopo da concessão ou contratação pública.
II – Os contratos de repasse parcial de escopo contratual de serviços de transporte, caso permitidos pela concessão ou processo licitatório, deverão especificar os requisitos para cumprimento do caput e sujeitam ambas as partes à responsabilidade solidária.
Parágrafo 4º – Para os efeitos desta Lei, enquadram-se como “poluentes tóxicos”: o material particulado (MP), sobretudo nas frações inaláveis MP 10 e MP 2,5, e os óxidos de nitrogênio (NOx).
Parágrafo 5º – Serão aceitas como fontes de energia, ao final da implementação do preconizado nesta Lei, apenas aquelas que não gerem emissões diretas de dióxido de carbono de origem fóssil no uso final.
Artigo 2º
Durante a gradativa substituição das frotas de cada ente operador de transporte, serão admitidas soluções de transição como a adoção de energias motrizes, nos lotes de veículos novos, total ou parcialmente fósseis, em seu uso final. Isso desde que as emissões do lote substituto para cada poluente tóxico e para CO2 sejam inferiores às emissões do lote de veículos substituído e permitam a plena e gradual convergência para as metas intermediárias e finais estabelecidas, seguindo os critérios e dinâmica desta Lei.
Parágrafo 1º – As soluções de transição mencionada no caput serão previamente propostas pelas concessionárias do serviço de transporte coletivo e operadores de transporte de carga registrados e regulamentados e avaliadas pelo grupo gestor, conforme estabelecido nesta Lei.
Parágrafo 2º – Outras soluções de gestão deverão ser implementadas, como programas para disseminar a direção econômica (ecológica) e redução da operação desnecessária em marcha lenta, sincronização semafórica e implantação de faixas exclusivas, ainda que os respectivos ganhos na redução de emissões não incidam diretamente na consolidação dos cálculos de emissão, para fins de cumprimento desta Lei.
Artigo 3º
Ficam estabelecidas as seguintes metas de redução das emissões no uso final para os três parâmetros do programa de adoção da nova matriz energética:
Parâmetro | Ao final de 10 anos | Ao final de 20 anos |
MP | – 90% | – 95% |
NOx (expresso como NO2) | -80% | -90% |
CO2 de origem fóssil | -50% | -100% |
Parágrafo 1º – Serão aplicadas as seguintes condicionantes:
I – O ano de referência para a redução das emissões será 2016.
II – As emissões serão contabilizadas em toneladas por ano, considerando as emissões típicas por quilômetro e a somatória das distâncias totais percorridas por cada veículo.
Artigo 4º
A progressiva adoção das tecnologias ou dos combustíveis limpos será pautada por marcos-metas, em intervalos de 05 (cinco) anos, a partir da data da entrada em vigor desta Lei, cabendo ao Executivo, representado por um grupo gestor intersecretarial, definir o cronograma ao longo desses quinquênios. De acordo com uma avaliação periódica anual, poderão ser fixados metas e respectivos prazos intermediários aos quinquenais.
Parágrafo único – Os requisitos e parâmetros para avaliação dos marcos-metas e cronogramas serão definidos em regulamentação específica do Executivo e observarão como padrão os percentuais de redução fixados no Art. 3º.
Artigo 5º
A substituição gradual das frotas de transporte coletivo público e dos veículos de carga em conformidade com as metas quinquenais e intermediárias, será acompanhada por um Grupo Gestor a ser integrado por representantes designados pelas Secretarias Municipais de Mobilidade e Transportes – SMT, do Verde e do Meio Ambiente – SVMA, de Coordenação das Prefeituras Regionais – SMPR, Serviços e Obras (SMSO) e da Fazenda – SF, sob coordenação da SMT.
Parágrafo 1º – O Grupo Gestor analisará e autorizará as propostas de substituição de lotes de veículos a serem apresentadas a cada ano, em tempo hábil, individualmente ou em conjunto, pelas empresas delegatárias do serviço de transporte público de passageiros e as contratadas para transporte de carga, listadas no parágrafo 1º do Art. 1º.
I – As propostas deverão conter cronogramas físico-financeiros e as variações de investimento em capital e de custo em operação, bem como as reduções previstas nas emissões, que deverão atender as metas estabelecidas nesta Lei e as intermediárias fixadas pelo Grupo Gestor.
II – As formas de cálculo e as emissões nominais de cada tecnologia para cada tipo de veículo serão publicadas pela SMT após 180 (cento e oitenta) dias de publicação desta Lei, sendo ajustadas anualmente de acordo com os avanços tecnológicos, informações dos fabricantes ou os resultados de testes homologados.
Parágrafo 2º – O Grupo Gestor poderá convidar representantes da Academia, associações de empresas concessionárias ou reguladas, de profissionais, de fabricantes e provedores de tecnologias e de entidades da sociedade civil relacionadas ao tema para prover subsídios técnicos.
Parágrafo 3º – Todas as tecnologias e motores propostos deverão estar homologados pelos órgãos responsáveis, como o Ibama e o Inmetro, sendo permitida a realização de projetos-piloto com novas alternativas, ainda não homologadas, desde que devidamente liberados pelo Grupo Gestor e monitorados pelas empresas, para levantamento de resultados operacionais pelos órgãos competentes.
Parágrafo 4º – O Grupo Gestor poderá considerar na análise das propostas apresentadas a redução de emissões indiretas de gás carbônico, ao longo da cadeia de produção e distribuição de energia e combustíveis, à luz de estimativas oficialmente ou cientificamente aceitas.
Artigo 6º
O Grupo Gestor emitirá anual e publicamente um relatório de avaliação dos resultados da substituição das frotas de veículos de passageiros e de carga, com recomendações sobre eventuais ajustes na estratégia de implantação conjugada das tecnologias mais limpas e renováveis com otimização de investimentos e custos.
Parágrafo único – O relatório será justificado por argumentação técnica, resultados de testes e medições e referências de literatura, e submetido à consulta pública, antes de sua edição final, para assegurar o controle social.
Artigo 7º
Veículos atendendo às metas progressivas de cada ciclo quinquenal poderão circular até ao final de sua vida útil, estabelecida nos contratos de concessão, mesmo que excedendo as metas estabelecidas para o ciclo seguinte.
Artigo 8º
A não apresentação no prazo determinado dos projetos de substituição de frota por tecnologias mais limpas e de menor geração de gases de efeito estufa acarretará em multa mensal de R$ 1.000,00 (mil reais) por cada veículo da frota prestando serviços ao município.
Parágrafo único – A primeira proposta deverá ser apresentada até o fim do período de seis meses de vigência da lei e válida para o ano calendário seguinte.
Artigo 9º
O não cumprimento das metas quinquenais e intermediárias de redução percentual sujeitará as empresas em desconformidade à multa mensal de R$ 3.000,00 (três mil reais) por veículo que constava na proposta apresentada e aprovada como devendo ser posto em uso com as novas tecnologias ou usando os novos combustíveis.
Parágrafo único – Incidirá na mesma multa a interrupção no abastecimento de veículos com os novos combustíveis menos poluentes propostos.
Artigo 10º
Será caracterizado como descumprimento dos contratos de concessão de operação ou contratos de serviço o não atendimento das metas.
Artigo 11º
A inspeção periódica, a ser vinculada ao licenciamento anual, para o controle de emissão de poluentes atmosféricos e ruído deverá ser retomada para todos os veículos automotores a combustão interna (ônibus, micro-ônibus, caminhões, utilitários, vans, automóveis, motocicletas entre outros), registrados no município, no prazo de 18 (dezoito) meses, contados da data de publicação desta Lei.
Parágrafo 1º – Também estarão sujeitos à inspeção periódica obrigatória os ônibus intermunicipais e os veículos que realizarem serviços de fretamento de passageiros e transporte escolar, emplacados em outros municípios, mas que, por força de regulamentação e atividade regular exercida no território do município, forem registrados em São Paulo para exercício da atividade.
Parágrafo 2º – A inspeção veicular será coordenada pela Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes, ficando esta a cargo dos registros, compilação de resultados, divulgação periódica e manter as demais secretarias envolvidas.
Parágrafo 3º – A inspeção veicular adotará como referência os limites fixados pelo Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve) e outras regulamentações aplicáveis, incluindo as para itens de segurança.
Parágrafo 4º – Ficarão dispensados da inspeção veicular:
I – Veículos novos nos 3 (três) primeiros anos de vida, contados a partir do ano de fabricação, para então ser efetuada a cada 2 (dois) anos. Após 11 (onze) anos, a inspeção passará a ser anual;
II – Veículos elétricos puros e híbrido-elétricos e movidos a outras tecnologias limpas e não fósseis, como células de combustível a hidrogênio e ar comprimido;
III – Os veículos já obrigados à inspeção anual, segundo normativa expedida pela Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Ambiental (INMETRO) para motores a gás natural, ficam isentos de realizar a inspeção aqui prevista.
Parágrafo 5º – Veículos antigos emplacados como de colecionadores ficarão sujeitos a requisitos específicos estabelecidos em regulamentação própria.
Artigo 12º
A não realização da inspeção veicular incorrerá em pena de pagamento de multa anual no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) por cada unidade veicular não inspecionada, a ser recolhida em favor do Fundo Especial do Meio Ambiente de Desenvolvimento Sustentável (FEMA).
Parágrafo 1º – A multa será majorada e cobrada em dobro a cada ano seguinte ao em que a inspeção deveria ter sido realizada.
Artigo 13º
As multas serão recolhidas em favor do Fundo Especial do Meio Ambiente de Desenvolvimento Sustentável (FEMA).
Parágrafo único – Os recursos arrecadados serão alocados no FEMA em centro de custo vinculado a projetos para redução das poluições atmosférica e climática.
Artigo 14º
O valor das multas estabelecidas pelos Artigos 9º, 10º e 14 será atualizado anualmente pela variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, acumulada no exercício anterior, sendo que, no caso de extinção deste índice, será aplicado outro que venha a substituí-lo.
Artigo 15º
O Poder Executivo regulamentará a presente Lei no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data de sua publicação.
Artigo 16º
As despesas decorrentes da aplicação desta Lei correrão por conta de verbas orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.
Artigo 17º
Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário, em especial o Artigo 50 da Lei Municipal nº 14.933/2009.
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